Determinação teve reviravoltas nas últimas horas, mas entidade máxima do futebol nacional confirma que jogo não terá a presença de torcedores
Por Danny Paiva, Joanna de Assis e Malu Rabello — Belo Horizonte e São Paulo
Depois de várias reviravoltas entre a noite de terça-feira e a manhã desta quarta, a CBF ratificou que a partida entre Cruzeiro e Palmeiras, no Mineirão, não terá a presença de público (clique aqui e saiba mais sobre a partida).
No fim dessa terça-feira, a entidade chegou avaliar a possibilidade de liberar a venda de ingressos para as torcidas dos dois times para o jogo desta quarta-feira, às 21h30 (de Brasília), no Mineirão, pela 37ª rodada do Brasileirão.
No entanto, diante do comunicado da Polícia Militar de Minas Gerais, de que não haveria tempo hábil para a montagem da operação de segurança, a CBF reforçou a determinação de que a partida tenha portões fechados.
Somente nesta quarta, a PM sinalizou positivamente para a presença de torcidas no estádio. No entanto, a CBF ratificou a decisão, determinando portões fechados na partida desta quarta-feira, mesmo depois do posicionamento da Polícia Militar (confira íntegra do ofício da CBF no fim desta matéria).
A corporação convocou coletiva de imprensa nesta manhã e explicou como a recomendação foi feita.
– O pedido foi para que houvesse uma reconsideração do nosso posicionamento. O nosso posicionamento é de que o melhor cenário é a torcida única, mas existe uma grande diferença entre eu me posicionar e quem tem o papel de decidir e tomar a decisão. Mesmo que a CBF tivesse deliberado lá atrás pela torcida mista, eu iria realizar policiamento. Com três possibilidades, eu identifiquei e manifestei oficialmente qual era de menor risco – detalhou o coronel Carlos Frederico Otoni Garcia.
No fim da manhã, Alexandre Mattos, CEO do Cruzeiro, questionou o posicionamento da PMMG. Segundo o dirigente, mesmo com os pedidos do clube para que a partida tivesse torcida dos dois times, a corporação só adotou uma postura diferente nas primeiras horas do dia do jogo. Mattos classificou qualquer tipo de operação com um prazo tão curto como “impossível” e “inviável”.
A própria CBF havia decidido que o jogo seria disputado sem a presença de torcedores, no domingo, após pedido do clube, reforçado pelo governo de MG e Ministério Público, por torcida única. A solicitação foi motivada por causa dos incidentes entre as organizadas dos dois clubes em outubro, em rodovia de São Paulo.
Na noite dessa terça-feira, a entidade máxima do futebol enviou ofício sobre a mudança de panorama ao Governo de Minas Gerais, ao Ministério Público, à Polícia Militar de Minas Gerais e à Federação Mineira de Futebol – que é responsável por comunicar ao Cruzeiro.
Em ofício emitido nessa terça-feira, a CBF relata que PM e Ministério Público não recuaram sobre a decisão de torcida única:
– Ato contínuo, a CBF, ainda nesta tarde, de forma incontinente, expediu àquela r. Corporação e ao Ministério Público ofício com formulação do pedido de revisão da recomendação anteriormente expedida para que o acesso ao estádio fosse apenas da torcida do clube mandante. Assim, de modo a preservar a coexistência de todos os fatores isonômicos necessários à realização da partida e à integridade da competição, a CBF, esclarecendo os fatos, e nos estreitos limites de sua competência e deveres legais, comunica e ratifica seu posicionamento no sentido de que, não tendo havido a reconsideração da PMMG e do MPMG, vedar o acesso dos torcedores de ambas as equipes na partida entre as equipes do Cruzeiro e Palmeiras, pois entende que o espetáculo e os direitos do torcedor devem ser preservados.
Em uma rede social, Mateus Simões, vice-governador de Minas, criticou a determinação da CBF.
– Somos contrários a fechamento de portões. Nosso pedido foi de torcida única, mas se a CBF determina torcida mista, a decisão final é dela, já que o evento é privado. Infelizmente, na hora de punir o Atlético com perda de mandos de campo a CBF foi rápida. Mas quando é um time paulista a entidade faz vista grossa, colocando o Cruzeiro em risco, e obrigando o pagador de impostos de Minas a financiar a segurança dos vândalos. Uma pena que o Palmeiras ou Flamengo tenham tratamento e benefícios que os times mineiros não recebem. Mas vamos iniciar uma discussão pública e ampla sobre os jogos em Minas. Minas tem a melhor polícia do Brasil e os nossos times contam sempre com a atuação do Estado, mas que fique claro: nenhum criminoso fantasiado de torcedor receberá proteção e esperamos a mesma postura dos clubes – escreveu Simões.
Entenda o caso
No fim de outubro, uma emboscada de uma organizada do Palmeiras contra um ônibus com cruzeirenses deixou um morto e mais de 20 pessoas feridas em uma rodovia de São Paulo. Diante do incidente, o Ministério Público de Minas Gerais, no fim de outubro, recomendou formalmente o banimento da organizada do Palmeiras em jogos no estado. No dia 18 de novembro, o Cruzeiro enviou um ofício à FMF e CBF solicitando torcida única para evitar “novo embate e confronto generalizado”.
Diante da solicitação, a FMF informou que “sempre ratificou e publicou todas as recomendações de acordo com o Ministério Público”. O MPMG pediu ainda que fossem analisados, pela Polícia Militar, os riscos da presença da torcida palmeirense, no jogo do Mineirão, pela penúltima rodada do Campeonato Brasileiro.
Em coletiva após os incidentes na final da Copa do Brasil, disputada na Arena MRV, Mateus Simões, vice-governador de MG, pediu que o jogo entre Cruzeiro e Palmeiras fosse realizado com torcida única. O pedido foi enviado à Federação Mineira de Futebol e a CBF. Caso não fosse atendido, Simões disse que iria judicializar a questão. Imediatamente, o comando do Palmeiras se manifestou contra o pedido.
O governo de Minas acionou a Justiça comum para liberar a presença de torcedores da Raposa no jogo, mas teve os pedidos negados na esfera judicial.
O Cruzeiro, inclusive, estava pressionando o governo de MG para garantir segurança e realização do jogo também com presença de torcedores palmeirenses. A Polícia Militar foi procurada pelo ge, mas não respondeu os contatos da reportagem.
O jogo é decisivo para as duas equipes no Campeonato Brasileiro. O Cruzeiro briga por vaga na próxima edição da Conmebol Libertadores, enquanto o Palmeiras disputa o título da competição com o Botafogo.
Confira íntegra do ofício da CBF à Polícia Militar:
“Referência: Ofício no 150.Sect/2024
Ao sr. Comandante Geral da Polícia Militar de Minas Gerais,
1. A Confederação Brasileira de Futebol (“CBF”) vem, pelos fatos e fundamentos jurídicos a seguir delineados, manifestar-se sobre o Ofício no 150.Sect/2024 remetido pela Polícia Militar de Minas Gerais, na madrugada de hoje, às 00:20h do dia 04/12/2024, em resposta ao Ofício no 3635 / 2024 que lhe fora enviado por esta Confederação.
2. Inicialmente, como se sabe, o Ministério Público de Minas Gerais, com base em parecer da Polícia Militar de Minas Gerais, recomendou que a partida entre Cruzeiro e Palmeiras, válida pela 37a rodada do Brasileirão Série A, fosse disputada somente com a torcida do clube mineiro mandante, ao argumento de que não teria como garantir a segurança dos torcedores dos dois clubes, o que foi rechaçado pela CBF. A entidade, na ocasião, por meio de ofício enviado no sábado passado, solicitou a revisão da posição firmada pelo órgão de segurança pública, pugnando, assim, pela realização da partida com torcida mista, em respeito aos princípios desportivos da reciprocidade, equilíbrio técnico e isonomia e, também, por não se ter identificado nenhum risco potencial e concreto à paz social – a manifestação do Poder Público se baseou única e exclusivamente num pedido deduzido pelo Clube mineiro, diretamente interessado e envolvido no tema.
3. O Ministério Público de Minas Gerais, porém, ainda no sábado, negou o pedido e manteve a sua posição.
4. Na tarde de ontem, às 17h, a CBF, certa de que o melhor para o espetáculo esportivo e para os torcedores era que o jogo fosse disputado com torcida mista, reuniu-se com o Comandante da Polícia Militar e, após ponderar os argumentos incorporados no ofício anterior, uma vez mais, cogitou a possibilidade de reavaliar a sua decisão no sentido de que o jogo fosse realizado com portões fechados.
5. A Polícia Militar, porém, durante as tratativas, posicionou-se contrariamente à possibilidade levantada pela CBF, defendendo, pois, a impossibilidade de que o jogo fosse disputado com torcida mista.
6. Tais fatos, aliás, foram consolidados no ofício no 3635/2024, por meio do qual, aliás, a CBF, pela terceira vez, requereu fosse alterado o entendimento da Polícia Militar.
7. Somente na madrugada de hoje, em ofício enviado à CBF às 00:20h, é que a Polícia Militar, concordando com as razões inelutáveis articuladas pela entidade que organiza e dirige o futebol no território nacional, retrocedeu e se manifestou pela possibilidade do jogo ser disputado com torcida mista ou com portões fechados.
8. Acontece, porém, que, em função da Polícia Militar de Minas Gerais ter encampado essa nova posição, com o máximo respeito, tardiamente, com menos de 24 horas do horário programado para a partida, não há mais tempo hábil para que a partida seja disputada com torcida mista, visto que a operação necessária à organização de uma partida de futebol, ainda mais de uma Competição como a Série A do Brasileirão, reclama o envolvimento e mobilização de inúmeros prestadores de serviços inúmeras atividades e serviços indispensáveis.
9. Justamente por isso, a CBF, na noite de ontem, considerando todos esses fatos e diante da ausência de manifestação formal da Polícia Militar, que até então não havia se manifestado, decidiu, no exercício da sua autonomia constitucional, pela manutenção da partida com portões fechados, o que foi publicado em seu sítio eletrônico em nota oficial divulgada às 23:51hs.
10. Sendo o que cabia para o momento, aproveita-se a oportunidade para renovar os protestos de estima e consideração.
Atenciosamente,
Julio Avellar
Diretor de Competições”