Sorridente, tranquilo e confiante. A imagem de Renan Lodi é reflexo de um titular indiscutível da nova fase da seleção brasileira de Tite, líder das Eliminatórias da Copa de 2022. Com quatro assistências em oito jogos, o lateral retorna ao time canarinho com o caneco do campeonato espanhol e fome de vitória contra Equador, dia 4 de junho em Porto Alegre, e dia 8, em Assunção, diante do Paraguai.
É difícil até dizer que a segunda temporada de Renan Lodi não foi exatamente um sonho para o jovem lateral de 23 anos, revelado pelo outro Athletico, o do Paraná. Afinal, ele fez a metade da minutagem da primeira temporada: foram 18 partidas como titular em 33 chances. Na temporada 2019/2020, saiu jogando em 39 de 43.
Mas, além de uma conquista marcante – o campeonato da Liga não vinha há sete anos – , Renan comprou a primeira casa própria – ela fica a seis minutos andando da Arena do Athletico – e acalmou o coração ao saber que os queridos avós Raimundo e Maria estão bem e vacinados.
Ele conta ao ge o que viveu nessa temporada e revela a divertida experiência do uruguaio Luís Suárez, estrela que trocou Barcelona pelos “colchoneros” e foi fundamental ao seu lado no Atlético.
Confira a entrevista de Renan Lodi:
ge: Você jogou menos esse ano, mas foi campeão espanhol. Qual balanço da temporada?
Renan Lodi: – O que passei esse ano com Simeone acho que me deixou mais forte. Primeiro ano cheguei e joguei tudo que você pode imaginar. Segundo ano, não. E geralmente é o contrário que acontece. Primeiro ano joga pouco e depois joga mais, começa a jogar. Mas ele vinha conversando comigo sobre isso.
“Olha, você tá jogando pouco, mas fica tranquilo. A gente aqui gosta muito de você.” Aí fui pesando essas coisas que ele vinha passando também. Ele sempre me falou que sou jogador muito importante.
Por que acha que saiu do time?
– No começo da temporada fiz 10 jogos, ele me tirou depois porque mudou esquema também. Mas foi aprendizado muito grande. Importante pelo lado mental, para trabalhar autoestima.
– Simeone me deixou mais confiante também. Até para fazer as jogadas. No fim da competição eu estava voando outra vez, graças a ele.
Em algum momento pensou que no banco poderia perder a vaga na seleção?
– Eu falava isso muito com a minha noiva. “Será que vou ser convocado de novo, será que vou estar no grupo para a Copa, para a Copa América?” Isso passava sempre porque você fazendo bom trabalho no clube você vai para a seleção, é nítido isso. Mas eu tinha preocupação muito alta sobre isso.
Fez preparação diferente para esta questão de entrar em campo para jogar poucos minutos?
– Desde quando comecei a jogar no profissional, em 2018, até a temporada passada, nunca tinha passado por isso. Começar no banco, entrar faltando dois, cinco minutos para acabar. Claro que estranhei. Depois passei a entender, “ele vai me dar dois minutos, então vou comer a bola como se fosse prato de comida”. E teve um jogo contra o Salzburg, entre faltando 50 segundos, ele fez a substituição para acabar o jogo logo, sabe? Mas entrei eufórico, consegui roubar a bola duas vezes, dei passe para frente. No dia seguinte ele me chamou, “quero essa atitude sua, de entrar desse jeito em todos os jogos.” E fui pegando essa mentalidade. E hoje levo ela comigo.
Superar Barcelona e Real Madrid é um acontecimento. E na capital, com o Real todo poderoso, deve dar um gostinho todo especial. Como foi?
– Foi uma loucura assim por tudo que aconteceu no campeonato, as lesões que a gente teve, a Covid-19, houve jogos que fomos com dois, três no banco de reservas. Passamos por várias coisas na competição. Estávamos com 13 pontos na frente, de repente a gente olha no retrovisor e estão Real e Barcelona com dois, três pontos, chegando. Para mim, particularmente, é um orgulho muito grande. Segundo ano de Europa já conseguir título tão importante é sentimento de muito orgulho, de trabalho bem feito. Tenho certeza que está todo mundo até hoje comemorando.
Como foi esse ano de parceria com o Suárez?
– Dentro de campo, é um cara chato (risos). No jogo contra o Osasuna que eu chutei e fiz o gol, ele está sozinho na área. No dia seguinte ele me chamou: “olha, você está vendo esse lance aqui, se você erra esse gol eu te mato, porque eu estava sozinho”. É um cara muito intenso como o Simeone. Ele quer a bola o tempo todo, tem que passar por ele. Mas é outro com quem aprendo bastante dentro e fora de campo. A todo momento ele está fazendo uma gracinha. Quando a gente vai levantar o título, ele me dá um empurrão com o pé. Então ele é sempre assim. É um cara sensacional, sempre de bom humor.
Vimos a imagem dele chorando. Ele estava ferido pela forma que saiu do Barcelona?
– Senti isso, sim, assim que ele chegou, nos primeiros treinamentos dava para sentir como ele estava triste. Diziam que ele não aguentava mais jogar em alto nível, falaram que não conseguia jogar 90 min, que estava muito velho para jogar no Barcelona, não sei o quê. Então, toda essa temporada, vê tudo que ele fez, 21 gols.
– Esse título mostra que ele consegue jogar 90 min, que é importante para todos, para a seleção dele. É um cara fenomenal. Esse título foi para falar assim: “Barcelona, estou aqui”.
Luis Suárez conquistou o seu quinto título do Campeonato Espanhol, o primeiro pelo Atlético — Foto: Getty Images
Na primeira temporada você falava de evolução física e defensiva. E agora?
– Ainda acredito que estou em processo de evolução na parte defensiva. Porque na ofensiva é natural para mim. Na parte defensiva, falava mais de posição de corpo, de saber defender, mas esse ano acho que ganhei no um para um, no enfrentamento, no contra-ataque, sabe? Foi mais nesse sentido minha melhora. Saber ler o jogo também, isso aprendi bastante também.
Li que você estava preocupado com seus avós por conta de Covid-19. Eles estão bem?
– Eles (meu avô Raimundo e minha avó Maria) moram em Serrana, no interior de São Paulo. Agora estão bem. Mas essa preocupação acabou me atrapalhando um pouco. Eu levava isso para dentro de campo, pensava que não estava levando, mas estava. Não tinham tomado a vacina ainda e na minha cidade estava começando a subir os casos. Os dois com 78 anos e eu ficava, “será que vai tomar vacina, será que não vai?” E aí ligava lá e nunca falavam a verdade, escondiam para não me deixar preocupado. E comecei a levar para dentro de campo. Mas agora já estão vacinados e está tudo bem.
Vibraram muito com o título?
– Nossa, tenho até um vídeo no celular, todo mundo em casa. Quando acaba o jogo, começam a soltar rojão, começam a soltar tudo. Gritaria do caramba (risos).
Há uns meses saiu notícia do Guardiola interessado no seu futebol. Como foi isso? Chegou algo?
– Isso foi uma coisa que cheguei a conversar com meu empresário se isso era verdade mesmo. Ainda mais porque a gente estava em reta final de competição e qualquer coisinha ia atrapalhar. O Simeone ia ficar doido, do jeito dele. “Está preocupado com outras coisas e tal”. E meu empresário falou que não era verdade, que era boato, tenho mais quatro anos de contrato lá, estou feliz lá também. Todo mundo me ama lá naquele clube, eu também tenho carinho por eles. Isso foi mais boato. Quem inventou isso, não sei.
Lodi ao lado de Casemiro, adversário de clube e companheiro de seleção brasileira — Foto: Lucas Figueiredo / CBF
Você quer ir para Tóquio. Por que é tão especial para atleta de futebol jogar uma olimpíada?
– Lembro do pênalti do Neymar no Maracanã. Quero participar disso, trazer o ouro olímpico para a gente. Naquele momento ali eu estava em casa, ainda, aqui no Athletico, assistindo e falando “um dia quero estar com Neymar, junto da seleção, ganhar título”. Apesar que ele só tem essa olimpíada e Copa das Confederações. Mas eu quero sim disputar, porque tem o Bolt, tem tanta gente com história. Esse evento todo, trazendo o ouro para o Brasil é muito bacana. Seu nome vai ficar marcado na história.
Simeone vai te liberar?
– Com ele não falei ainda. Falei direto com o diretor que quero muito disputar. Aí ele já começou a cochichar um pouquinho e vai saber o que eles estão pensando (risos). Mas a minha vontade eu deixei bem clara que é de disputar. Ele explicou que vou perder jogos, a temporada começa dia 15, mas eu falei que vou estar com ritmo de jogo, vou chegar inteiro. Não sei o que vai virar, mas minha vontade é isso. Mas isso vai ser decidido depois da Copa América.
Você muda muito sua forma de jogar quando vem para a Seleção. Precisa de readaptação à função?
– Já está tudo esquematizado na cabeça, o professor Tite sempre pede na preleção ali. Mas essa parte ofensiva minha é mais natural, porque eu era atacante antes, com 15 anos ali, depois que virei lateral. Então tenho facilidade para atacar. Quando chega na seleção e tem o Casemiro que fica ali, eu vou embora mesmo. Vou atacar mesmo. É uma coisa natural dentro de mim já.
Como é essa relação com o Athletico? Você se sente em casa até hoje, uma relação muito bacana.
– Estou aqui desde os meus 13 anos. Quem deu a minha primeira casa foi Athletico, o primeiro carro foi o Athletico, quem ajudou a minha família… então vir aqui em Curitiba, ver as tias da limpeza, quem estava sempre com você… Venho treinar depois da Copa América aqui também. É uma forma de agradecimento. Gosto demais daqui, gosto mesmo. Quando falei que estava com vontade de voltar, no início em Madrid, foi porque, realmente, assim que fui para o Atlético eu pensei, “puxa vida, vou perder tudo agora”. Por isso deu aquela louca de querer voltar, sabe? Mas graças a Deus passou isso, foi só no comecinho mesmo. Mas quando venho é para ver todos que me ajudaram desde que cheguei.